O Vigoroso Professor

Por Allan Regis
Amigos inseparáveis: o giz, a lousa, os livros e o professor gesticulando... Só vejo seus lábios moverem-se, pois não consigo escutá-lo neste ambiente superlotado e desrespeitoso; ele acabou de apartar uma briga e aula atrasou-se novamente... Estou numa carteira do meio... Ele já chamou a atenção de todos, mas não tem jeito... O fundo escuta seu funk debochado e impróprio para a hora e, talvez, para a vida... Alguém está falando bobagens ao celular proibido; uma turma conversa sobre seus rolezinhos e conversam pela rede social descaradamente... O coitado já está rouco – a aula é importante, eu sei, é sobre o período de ditadura militar, e uns poucos raros prestam atenção... A aula já, já acabará e eu, infelizmente, não consegui absorver precisamente o conteúdo, uma ou outra coisa deu para entender, mas perdi as partes mais importantes e interessantes que aumentariam meu saber... Sinto muito por este sujeito cheio de saberes pra transpassar. Sofrendo com o descaso da sala e de todo um sistema falido do qual ele não merece fazer parte... Ele carrega a depressão como parceira e enxerga seus talentos se enterrarem no lixinho do canto da sala, entre os bolinhos de papéis e restos de salgadinhos que fazem mal para a saúde e que ele tanto ensinou para não consumirem... Pérola aos porcos!... Alguns Dimas se salvarão e por eles o professor continuará... Sua autoridade segue questionada, ousam por o dedo em sua cara e ameaça-lo ou deixa-lo de lado por coisas insignificantes... Tenta usar as teorias que dizem ser a solução, mas observa que elas não surtem efeitos diante da alienação; não são só os alunos que bagunçam ou agem como quadrúpedes numa sociedade em que a família está destruída, mas há uma falsa direção instalada e que faz vistas grossas, acolhendo o nepotismo como algo lícito, e legitimando a quantidade em detrimento da qualidade – tudo não passa de faixada!
- Tchau, pessoal! – ele acabou de se despedir cabisbaixo carregando sua pilha de diários, listas e trabalhos ao lado de outros artefatos que o identificam.
Tenho certeza, depois vou ficar sabendo algo que se tornou normal: ele vai ausentar-se doente, ficaremos por um tempo sem aulas, mas logo arranjarão um jovenzinho eventual, sorridente, cheio de ilusões, e, sobretudo, um vigor que a precária educação pública vai sugar dele sem dó, e o ciclo vai repetindo-se para dizer como o sistema educacional brasileiro age cruelmente na vida do professor.